AS CARTAS DE TATI



Carta íntima
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Às vezes, fico dentro do meu quarto, com a luz apagada, ouvindo música e pensando em várias paradas... paradas que me dão o maior medo. Medo do mundo acabar, por exemplo. Isso é muito sinistro. Será que o mundo vai acabar mesmo? Cara, eu ainda quero tantas coisas. Ah, falando em mundo acabar, não se esqueça: você tem que me dar aquela bendita mochila, não pensa que esqueci não. E se o mundo acabar e você não tiver me dado, juro que vou te cobrar até a eternidade, hein, mãe!
Se bem que pode até ser bom o mundo acabar antes de mostrar meu boletim para você. Não que eu não tenha me dado bem, mas é claro que não vai ser o que você espera de mim, mesmo porque você sempre vem com aquele papo: “Ah, mas é porque eu te acho menina de dez e não de nove e meio!” Fala sério! piada, né?
Mãe, eu tenho medo de crescer, não conseguir casar e ficar que nem a tia Marisa, que ficou solteirona, virgem e vive reclamando de tudo o tempo todo. Ninguém merece dois minutos ao lado da tia Marisa, coitada. Quando a encontro na rua, eu tipo assim vou lentamente mudando de calçada, senão... fico mais angustiada e eu não tô podendo!
Aí, eu penso, se por outro lado eu não casar e não tiver filhos, não vou engordar, não vou ficar sem dormir todas as noites da minha vida, não vou ter que tomar conta de um monte de adolescentes pentelhos que não sabem o que querem... assim como eu! Ó vida, crescer ou não crescer, eis a questão.
Mas aí eu penso: Caraca! Todas as pessoas crescem um dia, menos o Peter Pan, é claro! E já me vejo como a Wendy, na Terra do Nunca, de mãos dadas com o gato que faz o Peter Pan do filme (como é mesmo o nome dele?). Ele me tratando de princesa e eu lá, tomando sol, comendo frutas, nadando naquele mar maravilhoso e de repente... aparece um bando de meninos perdidos para acabar com a minha alegria e ficar me chamando de mãe! Fala sério! Tô fora. Nem o Peter Pan consegue impedir a gente de crescer!
Sabe, mãe, crescer também significa que um dia você e o meu pai não vão mais estar aqui e isso me dá medo...
MÃE, VOCÊ NÃO TÁ ENTENDENDO!
Tô mal... Dá pra cuidar de mim?
PERISSÉ, H. Mãe, você não tá entendendo... As Cartas de Tati. São Paulo: Objetiva, 2004. p. 12-13.

QUESTÕES PARA VOCÊ REFLETIR

1) Nesta carta, Tati revela à mãe os seus medos. Quais são eles?
2) Esses medos são todos razoáveis?
3) Os medos vêm junto com os sonhos. Qual o sonho de Tati evidenciado aqui?
4) Você percebe críticas na carta?
5) Os assuntos de Tati vão surgindo e são interrompidos, conforme lembranças que ela vai tendo. Parece uma conversa. Deem exemplo dessa forma de escrever.
6) Essa conversa está claríssima, ao longo da carta, pelo uso de um estilo coloquial e típico do adolescente. Que recursos marcam esse estilo?
7) Apesar do título, você acha que a garota gosta da mãe? O que você imagina pela carta: a mãe não dá atenção à filha, ou é uma visão só da menina?
Como você viu, o texto é bastante verossímil: a escolha do gênero carta íntima define uma linguagem despoliciada, solta, revelando a alma da garota com bastante pertinência, em que se misturam críticas, confissões e até humor.

PRODUÇÃO TEXTUAL

Produza uma carta destinada a um colega de classe. 



Observações: atividades sugeridas no Gestar



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